quinta-feira, 18 de agosto de 2011

A calça Jeans emprestada

Ha uns dois anos atras , mais ou menos, eu fui contratado por uma empresa  de telefonia celular  para trabalhar como  caricaturista de um evento  do dia dos namorados . Eu havia dito ao pessoal da empresa que o número de horas a serem trabalhadas era insuficiente, pois (modéstia a parte), existe muito assédio pelos desenhos que faço nos eventos.  Eu avisei tambem que depois do fim do meu horário de trabalho á tarde eu teria que ir pra um outro evento e o novo contratante, pai do garoto aniversariante, veio me buscar de carro. Díga-se de passagem , um carro bonito e muito confortável. Não haveria mesmo nenhum  modo de que eu chegasse áquele próximo evento naquela distância e eu não dirijo. Por isso combinei com meu segundo contratante que ele me apanhasse de carro.  Chegando no local, percebí que era um condomínio de luxo. A festa estava bombando, e imediatamente comecei o meu ofício que certamente seria pela madrugada á dentro.  Final de festa, como eu esperava, foi um sucesso, mas eu estava exausto e minha roupa ficou toda suja de tinta, felizmente era facilmente removida com sabão em pó , mas só depois de lavada.  Eu conversei ainda de madrugada, após a festa, com aquela doce senhora, mãe do meu contratante, que gentilmente preparou um pequeno quarto onde eu pusesse repousar. A conversa com ela foi muito amistosa, como se eu reconhecesse uma velha tia, alguem com a docilidade da dona Benta do Sítio do Pica-pau-amarelo. Na conversa eu contei sobre minha tragetória como desenhista, como me mantinha, as dificuldades do passado para um reconhecimento do trabalho, tambem contei algumas histórias pessoais de família,muito emotivas, coisas que nos colocaram em plena identificação e dalí nascia uma amizade entre uma 'tia'adotada e um 'sobrinho' postiço. Me sentí grato aos céus por ter conhecido aquela alma com quem tanto me identifiquei. 
Pela manhã fui surpreendido por um telefonema da primeira empresa contratante pedindo urgentemente que eu considerasse mais horas de trabalho, pois o publico ja havia feito uma lista de espera aguardando a minha volta para desenhar no dia seguinte. Eu tinha que sair ás pressas e pegar um taxi, mas a "tia" ja estava de pé , bem cedo e me ofereceu um café e me questionou como eu poderia trabalhar com a roupa suja de tinta e foi logo me oferecendo tres calças do filho dela, para eu escolher, de modo que seriam emprestadas. Eram caças simples, jeans, mas só uma me coube bem e ficou com uma estética muito boa.  Prometí devolver.
Naqueles dias eu fui contratado seguidamente para outros eventos e quando cheguei em casa não havia lavado ainda a roupa suja. o jeito foi usar a mesma calça que me coube tão bem.  O outro evento foi numa festa junina num famoso shopping da Zona Sul do Rio de janeiro. Lá tambem foi um turbilhão de gente. Eu cheguei a pensar que ficaria muito constragido se o dono da roupa me visse por aí usando ainda sua calça. Meu pensamento parece até que foi ouvindo por um gênio da lâmpada, pois de repente me esbarrei com todos eles da família que vinham caminhando pelas ruelas e barraquinhas juninas do local. Minha reação foi
abraçar a todos e cumprimentá-los como se nada tivesse acontecido. Eu estava muito sem graça ,pois estava ainda usando a calça jeans meio surrada. Expliquei que ainda não havia tido muito tempo para fazer a devolução da peça. e fui logo me despedindo e prometendo entrar em contato tão logo fosse possível.  E fiz mesmo. Mas sempre nos desencontráva-mos por causa dos horários dele ou dos meus. Por fim nos achamos ,mas eu estava trabalhando (desenhando) num outro evento num prédio  onde ele ficou a esperar por alguns instantes  na portaria e uma funcionária da empresa foi até o carro dele levar a calça jeans que a mãe dele me emprestou  com tanto carinho, mas que pertencia a ele.  Nos primeiros contatos que eu havia feito com este moço ele era meu fã e prometia desenvolvermos nossa amizade, mas algo acabou com tudo: ele tinha apêgo por aquela calça e por causa de um mal entendido ele se distanciou. Acredito que ele havia pensado que eu me apoderaria indevidamente, mas eu ja havia lavado  e estava pronta pra ser entregue e foi. Eu agradecí ,mas com o coração apertado. Eu tinha certeza de que ele fechara a porta alí e por ciúme de sua mãe e de sua calça ele nunca mais apareceu. Aquela família era muito amiga e tinha valores muito nobres,mas por causa do apêgo de alguem  uma porta de amizades múltiplas foi fechada. Um dia,  bem certo estou de que o amor não encontrou caminhos sublimes porque não se curvou ás dimensões densas dos apegos materiais. Muitos só acordarão quando tentarem agarrar seus bens e seu corpo, assim como uma calça jeans emprestada, ja não estiver mais disponível. Mas a calça voltou para o seu dono, e nós um dia voltaremos  para algum lugar,depois que devolvermos a vestimenta que cobre nosso valor mais precioso, nosso espírito.

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